Antônio PARREIRAS 1860-1937

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Les saules Retornar

L’étang reflète, | Profond miroir, | La silhouette | Du saule noir | Où le vent pleure…
PAUL VERLAINE, La lune blanche (in La Bonne Chanson, 1872)

É sempre uma grande satisfação ser surpreendido por uma bela obra até então inédita que vem a público, a despeito da familiaridade e do conhecimento que os anos dedicados ao estudo da pintura brasileira nos propiciam. É o caso da admirável tela de Antônio Parreiras, Les Saules (Os salgueiros), datada de 1915. Criada no mesmo ano em que Anita Malfatti pintou O Farol, não perde em modernidade para a artista paulista; ao contrário, pode-se considerar uma evidência de que nossos pré-modernistas eram tão avançados quanto nossos artistas da festiva Semana de 1922.

Antônio Parreiras - Les saules 1915

De fatura ampla, o primeiro plano construído em plena pasta revela o vigor impetuoso do pincel, da espátula e da personalidade intensa do artista. Os salgueiros, tema central da composição, são tratados com desenho nervoso, ágil, preenchidos com manchas de cor sobre uma imprimadura de terra de Siena queimada, emprestando os desejados matizes quentes. O céu e o arvoredo ao fundo são construídos com mais suavidade, em tonalidades frias de azuis de cobalto e violáceos, contrastando com a violência da fatura do conjunto. O artista também utiliza intensamente o difícil recurso da respiração do suporte, ou seja, deixando aparente e intacto o branco da tela, aqui e ali, quase que uma marca registrada do grande paisagista.

Não cabe dúvida que a obra, plena de entusiasmada energia, foi pintada diretamente do natural no início do verão.

A composição é baseada numa simples diagonal ascendente, em elegante linha que desenha uma curva apoiada numa construção ao fundo, no alto, fechando a lateral direita da imagem. É importante destacar que o pintor contrapõe à diagonal as formas dos salgueiros, como uma polarização de forças que impõem forte dramaticidade ao cenário. Na agitação da paisagem, para obter o equilíbrio desejado, Parreiras salienta em primeiro plano a dupla haste vertical de um arbusto seco, representado com toques de branco de prata, auxiliando a ancoragem na organização da obra.

Esta pintura está localizada na Suíça: em seu livro sobre Antônio Parreiras, o crítico e historiador de arte Carlos Roberto Maciel Levy informa que o pintor deixou Paris em setembro de 1914, ao eclodir a Grande Guerra, retornando ao Brasil durante aproximadamente sete meses. Voltou à Europa em maio de 1915, percorrendo sobretudo a Córsega (Ajaccio, Piana, Sartène) e a Suíça (Vallée de la Dala, Loêche-les-Bains). Não cabe dúvida, portanto, que a obra — plena de entusiasmada energia — foi pintada diretamente do natural no início do verão.

O Museu Antônio Parreiras, em Niterói, guarda em seu acervo desenho a fusain muito similar ao tema aqui tratado, com a mesma composição, mas desta vez captado em estação do ano, fim do outono e início do inverno, diametralmente oposta à da pintura. Datado de dezembro de 1917 e localizado na França, este desenho revisita o tema dos salgueiros, tão caro aos pintores e à arte francesa oitocentista, como constatamos em Corot, Daubigny, Monet e van Gogh, dentre tantos outros.

CLÁUDIO VALÉRIO TEIXEIRA

Antônio Parreiras - Salgueiros em dezembro 1917

Texto inédito reproduzido por cortesia do autor. Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.

Imagens de obras de arte

Antônio Parreiras - Les saules, 1915
óleo sobre tela 55,0 x 75,0 cm
assinada, datada e localizada (Les saules | AParreiras | Suisse 1915) no canto inferior esquerdo
Coleção Edgar da Silva Ramos, Rio de Janeiro RJ (fotografia de Jaime Acioli)

Antônio Parreiras - Salgueiros em dezembro, 1917
carvão sobre papel 58,6 x 91,0 cm
assinada e datada no canto inferior esquerdo (AParreiras | 1917) e assinada, datada e identificada (AParreiras | 1917 | Salgueiros em dezembro França) no canto inferior direito
Coleção Museu Antônio Parreiras, Niterói RJ (reprodução)
No catálogo da XXX Exposição Geral de Belas Artes, em 1923, o desenho está listado sob o título Les saules morts, cat.203, p.75.